A Arte desvenda um enigma, ou por outra, ela consiste em um
autoenigma – esse é o trilho de várias formas de pensamento artístico, e
pegamos logo um dos pesados-pesos: a corrente hegeliana. Muitos, e também Hegel,
procuraram resolver a questão de como um pedaço de madeira, desde que
trabalhado em uma estátua, ou um som, resultante do constrangimento do ar pelo
bambu de uma flauta, podem ser diferentes de zilhares de pedaços de pau ou sons
outros.
A solução hegeliana: a Arte, Midas de sempre, com um toque transforma
os objetos. Por outra: a Arte se opõe ao chamado real porque este real é apenas
chamado real, ele não é a verdade verdadeira. A realidade é o Espírito (Geist) e este não se manifesta ou se
manifesta imperfeitamente no que chamamos de vida. A Arte é uma das três formas
de o Espírito acontecer – as outras são a filosofia e a religião. Claro – ao contrário
desses dois outros campos, a arte se manifesta em objetos – quadros, sons,
papel. Está sujeita às limitações de todo ser individual. E as supera,
transcendendo tudo, por que é arte. É a diferença entre o azul puro numa tela
de Vlaminck e o mesmo azul na parede do meu prédio. O primeiro quer exprimir o
Espírito. O segundo só quer exprimir Azul.
Tomemos uma manifestação qualquer de Cultura Digital. A
performance Audiovisual por exemplo. No meio desta nota cito um exemplo. Luzes,
ritmos, som concatenados. As luzes seguindo um padrão identificável, uma
simetria em relação aos eixos vertical e horizontal, convergindo ou fazendo
movimentos divergentes a eles.
A Mona Lisa tem um Enigma. E Capitu e o chato do príncipe Hamlet,
com suas indiretas e seu arquicélebre vou-não-vou. Os sons e ritmos, o que por
trás há deles? Que Espírito manifestam? São mais reais que o real, como uma
heroína de Dostoievski parece mais real que as nossa vizinha? Se os ritmos da
performance querem apenas expressar a performance, ele se negam como arte, ao
menos no sentido hegeliano. Na arte há sempre um atrás-de.
A negação disso ocasiona a perda de sentido da própria Arte.
A Cultura Digital, para ser Arte Digital, precisa de algo a ser desvendado pelo
espectador.
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