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sexta-feira, 23 de março de 2012
segunda-feira, 12 de março de 2012
Resenha de filme - Depois da Chuva, de Takashi Koizumi
Kurosawa decidiu pela delicadeza – é a lição se Após a Chuva, filme feito por seu discípulo Takashi Koizumi baseado em roteiro que foi deixado quase completo pelo mestre.
O samurai sem emprego Misawa vaga pelos interiores do Japão feudal em busca de ocupação, junto com sua esposa. São pobres. Um rio em enchente os impede de passar, e eles têm de conviver com outras pessoas em uma hospedaria. Misawa acha que sua mulher se ressente da pobreza, e sempre tenta sair daquela situação. Mas sua mulher o admira e só quer ficar com ele. Misawa contrasta com os samurais em geral, reis da testa franzida: ele é gentil, delicado, sorri. Isso em nada atrapalha sua habilidade de bom lutador. Para trazer comida às pessoas da hospedaria ele some e faz uma luta por dinheiro – uma grande desonra para um samurai.
Pode ser visto como um filme paralelo a Sanjuro, de 1962, trinta e sete anos antes. Neste, um samurai pobre ajuda rapazes ricos a saírem de uma encrenca. Os rapazes são uns bobocas, e Sanjuro Tsubaki não perde nenhuma oportunidade de lhes jogar isso na cara. Sanjuro e Misawa passeiam por uma sociedade feudal injusta que os condena a vagar sem rumo certo. Ambos têm uma bondade intrínseca. Sanjuro vê a estupidez humana e a ironiza e ressalta.
Kurosawa se rende em Após a Chuva – rende-se à doce estupidez humana, seu egoísmo, seu quase suicídio coletivo. Misawa sorri da tolice alheia, compreende, e tem esperança. O discurso de sua mulher perdoando e enaltecendo o marido para os empregados de um senhor feudal é um hino à delicadeza.
A delicadeza – a conclusão de uma vida dedicada a fazer arte com cinema.
segunda-feira, 5 de março de 2012
Resenha de filme: Billi Pig, de José Eduardo Belmonte
Na linha despretensiosa, filme com a grife Selton Mello: gags, caretas, confusões, equívocos, cortes rápidos de cena. O início: Marivalda (Grazi Massafera), suburbana carioca candidata a atriz bonitinha e desprovida de qualquer talento, ouve conselhos de um porquinho de pelúcia falante, quer ser uma grande estrela, e é casada com Wanderley (Selton), dono de seguradora falido. Para segurar a mulher, este planeja um golpe com o falso padre (Milton Gonçalves) para arrancar dinheiro de um chefe do tráfico.
Billi Pig é filme gêmeo de “Reis e Ratos”, estreado também há pouco. Os núcleos da trama começam dispersos, e numa história bem conduzida espera-se que antes da metade do filme estes já estejam unificados e coerentes uns em relação aos outros. Não ocorre. Nos dois filmes, os cortes rápidos demais dificultam a compreensão de uma trama em que várias sub-histórias ficam incompreensíveis (Reis e Ratos) ou inúteis (Billi Pig). O romance insinuado entre a dona da funerária (Preta Gil) e seu empregado charmoso não se desenvolve, o que é uma pena, e queda sem final.
Em Billi Pig certos elementos também surgem do nada, como o pato pintado de azul. Cabe lembrar Pirandello, para o qual cada fato no teatro tem ser precedido por premonições, e sucedido por comentários. Por si mesmo, o fato é um saco vazio que só se põe de pé desta forma.
Por incrível, Billi Pig é assistível. Não é Glauber Rocha. Mas traz alguns sorrisos e uma ou outra gargalhada. Não é pouco.
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012
Resenha de filme: Reis e Ratos, de Mauro Lima
Reis e Ratos consiste em três desperdícios.
O filme não é ruim. Só desperdiça:
a) O título. Meu reino por um título, poder-se-ia parodiar o rei Ricardo III. Só que esse título era digno de uma balada existencial à la Akira Kurosawa ou alguma produção inspirada em Shakespeare. É uma pena utilizá-lo em um filme que se autodefine despretensioso, e é;
b) O tema. Enfocar o Brasil pré-golpe de uma forma humorística é brilhante. Principalmente a escura atuação dos EUA nesse sentido;
c) O elemento do acaso. Seguidos planos de uma trama golpista são desvendados involuntariamente por um locutor médium, que denuncia os fatos antes que aconteçam. O acaso ter consequências grandes dá sempre margem para boa trama.
Que não se desenvolve. Reis e Ratos parece um filme feito para o ego de Selton Mello, com sua interpretação forçadíssima – parece que era esse o propósito. Como fala rápido demais, e contando com o som menos-que-perfeito de nossas salas de cinema, nem sempre se pode entender o que fala.
A trama rapidece demais, principalmente no último quarto. Os cortes são quase instantâneos, quando se pensa que todas as pontas soltas do início se unirão em um eixo narrativo só - elas continuam soltas. A transformação que o locutor sofre, de médium para espadachim e arqueiro, queda forçada.
A trama: Troy Sommerset é um agente da CIA que quer ficar no Brasil. Quer derrubar o presidente, com a ajuda de um oficial da aeronáutica. Para isso tramam uma série de golpes, que são desvendados pelo médium já mencionado.
Observe-se que, talvez por medo dos onipresentes processos, o filme não menciona o nome João Goulart, e quando representa o presidente, coloca um ator completamente diferente do próprio.
E quando a trama parece estar longe de terminar, ela termina. O golpe militar parece o deus ex machina das tragédias gregas, lembrando que se tratava de um deus que intervinha na trama e resolvia tudo. Tinha esse nome porque o ator vinha conduzido por cima em um cesto sustentado por uma balança, uma máquina, colocada atrás do palco. A história termina sem terminar. Há boas piadas, boas mas fica a sensação: que raio que foi que aconteceu mesmo?
De resto, melhor Reis e Ratos que 90% do lixo hollywoodiano.